quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Sobre Pastores e Vuvuzelas



Hoje (28/6) li uma reportagem interessante no jornal “Estado de Minas” (principal jornal de Minas Gerais). Era noticiado o resultado de alguns estudos científicos sobre o perigo das vuvuzelas (aquelas cornetas africanas que tornaram o som ambiente dos jogos de futebol na Copa semelhantes ao barulho de enxames de abelhas). De acordo com os especialistas, a exposição por muito tempo ao som das vuvuzelas pode gerar danos irreparáveis ao ouvido humano. O som das vuvuzelas pode atingir, de acordo com as medições, 140 decibéis. Ruídos semelhantes à turbina de um avião.
As vuvuzelas são, à primeira vista, contudo, inofensivas. Ouvimos a repreensão “Você vai ficar surdo!” se o volume do seu radinho de pilha estiver alto, mas dificilmente ouviremos a mesma repreensão se tocarmos uma vuvuzela, ou por estarmos em um lugar onde ela seja tocada.
As opiniões sobre as vuvuzelas são distintas. Muitos são indiferentes a elas. Alguns odeiam o barulho ininterrupto delas na TV e outros a consideram até simpática. Fato é que as vuvuzelas caracterizaram o povo africano. A eliminação precoce e vergonhosa de grandes seleções do mundo como França, Itália e Inglaterra pode ser esquecida, mas algo que as pessoas jamais esquecerão será o som abelhudo e ininterrupto de milhares de pessoas soprando as vuvuzelas durante os jogos da Copa na África.
As vuvuzelas são aparentemente inofensivas e são também (para algumas pessoas) simpáticas. Contudo, a verdade é que elas podem causar danos irreversíveis ao nosso sistema auditivo.
Percebi uma associação interessante entre alguns pastores e as vuvuzelas. Diferentemente do que você possa ter pensando ao ler o título, a relação não se encontra no fato de que alguns pastores gritam de forma estridente no púlpito a ponto de parecem vuvuzelas. Não! A minha proposta com este texto é que parte considerável do conteúdo que tem sido ensinado nas igrejas evangélicas hoje em dia é similar às vuvuzelas.
À primeira vista ensinamentos como a “Teologia da Prosperidade” são inofensivos. Eles também parecem ser às vezes bem simpáticos (quem não gosta de ouvir que será prospero financeiramente por promessa de Deus?). Jargões evangélicos como “O melhor de Deus ainda está por vir” ou “Deus cumprirá a promessa em sua vida” não parecem conter perigo algum. São frases simpáticas e, à primeira vista, completamente inofensivas. Elas até mesmo atraem pessoas para as igrejas, não é?!
Os ensinamentos que estão por trás destas frases, no entanto, são tão devastadores para nossa saúde espiritual como o alto som das vuvuzelas é para nosso sistema auditivo. Ontem, durante o culto dominial, prestava atenção à letra de uma música que dizia, entre outras coisas, “A Palavra de Deus me garante comer do melhor que existe na Terra”, “Sou cabeça, não sou calda”, “Sou filho do rei, embaixador, eleito de Deus, delícia do Senhor”.
Será que quem canta não percebe que, necessariamente, para que algumas pessoas possam “comer do melhor”, “comer com sobra”, algumas simplesmente não vão comer nada? Será que as pessoas não percebem que, uma vez que os recursos naturais são escassos (princípio mais básico e mais importante da Economia) o acúmulo de recursos nas mãos de alguns necessariamente implica na escassez de recursos para outros? E pior, será que as pessoas acreditam mesmo que o Deus todo amoroso, o Deus que não faz acepção de pessoas (Deus não distingue entre uns e outros) (Atos 10:34), compactua com este sistema que promove tanta desigualdade? Será que Deus realmente considera alguns “delícia”, em detrimento dos seus demais filhos?
Por mais estranho que isto possa soar, a pregação no culto dominical de ontem foi sobre as inúmeras dificuldades de vida do povo africano, e sobre como alguns “desejos” nossos são tão fúteis. “Quero trocar as cortinas de casa!” (Exemplo citado pelo pastor.) Isto não soa tão fútil quando comparamos nossa vida com a vida dos africanos que, quando muito, comem uma vez por dia? Veja que incoerência: o período de louvor alimentou no coração da igreja vários “sonhos” que, minutos depois, foram corretamente tratados como “futilidade”.
À primeira vista os ensinamentos de prosperidade evangélicos são inofensivos. Eles são simpáticos. Eu sou delícia do Senhor, não sou? Eu tenho a marca da promessa, não tenho? Eu estou autorizado a prosperar, não estou? Eu sou cabeça, não sou?
Pensamentos ególatras como estes não condizem com a mensagem de entrega, esvaziamento e negação pregada pelo Mestre. O reino Dele é o reino dos pobres (Mateus 5:3), é o reino onde os pequenos governam (Mateus 18:4), onde os loucos predominam sobre os sábios (I Co 1:27), onde quem não é, humilha quem é (I Co 1:28)! A mensagem deste reino é tão adversa às futilidades presentes no coração dos ricos que, nas palavras do próprio Mestre, é mais fácil um camelo passar pelo buraquinho de uma agulha que um destes entrar no reino (Mateus 19:24).
Essa teologia que se preocupa apenas com o próprio umbigo, que se acha no direito de “comer do melhor” enquanto tem uns que não comem nada; que se acha no direito de ser explorar quem é “calda” apenas porque se acha cabeça; que se considera “delícia” apenas porque recita meia dúzia de frases que ouviu na igreja; Essa teologia é extremamente prejudicial à nossa saúde espiritual. Aqueles que estão associados a ela estão cegos e surdos a muito!
Portanto, pastores, prezem por aquilo ensinam ao seu rebanho com diligência e temor! Existe muita coisa nesse mundo que parece ser simpático e inofensivo à primeira vista, mas que, na verdade, é destruidor! Assim como as vuvuzelas…
Postado por Eliel Vieira

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