Carlos Moreira
Um dos filmes que mais marcou a minha adolescência foi “All That Jazz”. Interpretado pelo ator Roy Scheider, ele foi exibido no Brasil sob o título “O Show não Pode Parar”. Na verdade, trata-se de um relato semi-autobiográfico da vida de Bob Fosse, escritor, diretor e coreógrafo, vencedor, dentre outros prêmios, do Oscar.
Em “All That Jazz”, Joe Gideon é um produtor que está montando uma peça para a Broadway. Em sua cansativa rotina, ele sempre começa seus dias ligando o toca-fitas, pingando colírio nos olhos e tomando comprimidos de dexedrina. Em seguida, entra no banho, olha-se no espelho e repete a famosa frase: "It's show time folks!" – “É hora do show pessoal!”.
Como acontece em outros musicais de Fosse, o bom e atento espectador perceberá que a idéia central do filme é mostrar que, na sociedade contemporânea, todos nós acabamos vivendo no “mundo do espetáculo”, baseados na fantasia, na encenação, na imagem.
“Jesus entrou no templo e expulsou todos os que ali estavam comprando e vendendo. Derrubou as mesas dos cambistas e as cadeiras dos que vendiam pombas, e lhes disse: "Está escrito: ‘A minha casa será chamada casa de oração’; mas vocês estão fazendo dela um ‘covil de ladrões”. Mt. 21:12-13.
Talvez você esteja se perguntando: mas o que esta passagem de Mateus tem a ver com o filme “All That Jazz”? Eu lhe respondo: tudo. Você conhece o texto... Nele Jesus entra em Jerusalém e se depara com o “show” montado do lado de fora do Templo. Era o shopping da religião, onde tudo podia ser comprado, desde souvenirs e quinquilharias “sagradas”, até animais, comidas e plantas para se fazer “ofertas”, e isso sem falar no câmbio do dinheiro estrangeiro, feito com pesado ágio. Sem dúvidas, ali funcionava um grande centro de negócios, operado em pequenas barracas, que promovia um comércio farto e rentável.
Mas Jesus ao ver a perda da significação de propósito daquele lugar, ao constatar a cauterização a qual chegara à consciência da nação de Israel, ao perceber o endurecimento do coração daquela gente, os disfarces, as encenações, as aparências, partiu para cima da “moçada” com azorrague nas mãos distribuindo tabefe para todo lado e repetindo, como um mantra, “a minha casa será chamada casa de oração”. O barraco foi grande, não ficou nada de pé.
Eu acredito que a grande tristeza do Galileu foi ver que aquele tipo de religião era calcado em exterioridades, em ritos ocos, mortos, dessignificados. Era uma liturgia esvaziada de propósitos, a oferta banalizada, o desrespeito com o altar, que significava a oferta, a entrega do que sobejava, a dádiva sem esforço, o arrependimento “epidérmico”, sem conseqüências ou desdobramentos, a contrição de ocasião, o sacrifício do ideal no altar da conveniência. Tão semelhante com o nosso tempo...
Mas, no dia seguinte, o que você acha que aconteceu? Que os “traficantes do sagrado” estavam de joelhos no Templo? Que os “mercadores da religião” estavam aos prantos no átrio? Que os “feiticeiros da fé” estavam com pano de saco e cinza sobre a cabeça? Que nada! No dia seguinte, tudo já estava de pé novamente, refeito, rearmado, e o comércio tinha voltado a “operar” normalmente, do mesmo jeito de antes, afinal de contas, “O Show não Podia Parar!”.
Quero lhe dizer algo: viramos o mês, o ano, e até a década, mas sua vida pode continuar a mesma, virada pelo avesso! Passadas as festividades, o brilho dos fogos, a comilança, os presentes, o champagne, a rotina levanta-se como um leviatã para devorar tudo, pois, o ano se foi, mas não se engane, os problemas ainda estão aí, eles continuam os mesmos.
Quando você se olhar no espelho, nesta segunda feira, depois de realizada sua rotina matinal, precisará escolher entre começar um novo ano, uma nova vida, em rever suas escolhas, valores, princípios, prioridades, ou voltar a repetir tudo de novo, as mesmas práticas e, como no filme, declarar: “É Hora do Show Pessoal!”. Sim, não se engane, a religião entorpece o ser, deixa dormente os sentidos, embebeda a consciência, ilude o discernimento. Creia-me, até o sagrado pode se tornar rotina, algo mecânico e enfadonho, que come o ser por dentro e só deixa trevas e morte.
É isto que, com tristeza, tenho visto. Entra ano, sai ano, e a vida da grande maioria das pessoas continua a mesma. Pactos são feitos, promessas, correntes, campanhas, “salamaleques” dos mais diversos, mandingas evangélicas, “boacumba”, e nada muda! Não muda o caráter, não mudam os valores, não muda o “olhar”, a consciência, o coração, as atitudes. Pelo contrário, a vida segue da mesma forma, pois tudo é parte de um grande circo, de uma encenação, é um embuste, um estelionato, a fé arrotada pela boca, a letra morta, contudo contradita pelas ações, pois não houve arrependimento – metanóia! .
Por isso, vamos lá! Comecemos tudo de novo! Levantemos a lona do circo para entrarmos no “picadeiro” da existência! Acendam-se os holofotes, liberem os “palhaços da vida”, as “marionetes da religião”, os “saltimbancos anarquistas”. Sim, deixem que comece o espetáculo, baixem as cortinas para que entre em cena o disfarce nosso de cada dia. E não nos esqueçamos do principal: “o Show não Pode Parar!”.
Carlos Moreira é culpado por tudo o que escreve. No palco da vida, foi julgado e condenado, mas salvo pelo sangue de Jesus. Além de escrever para o Genizah, posta também na Nova Cristandade.
Um dos filmes que mais marcou a minha adolescência foi “All That Jazz”. Interpretado pelo ator Roy Scheider, ele foi exibido no Brasil sob o título “O Show não Pode Parar”. Na verdade, trata-se de um relato semi-autobiográfico da vida de Bob Fosse, escritor, diretor e coreógrafo, vencedor, dentre outros prêmios, do Oscar.
Carlos Moreira é culpado por tudo o que escreve. No palco da vida, foi julgado e condenado, mas salvo pelo sangue de Jesus. Além de escrever para o Genizah, posta também na Nova Cristandade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário